segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Não quero ser membro da Igreja...


Não quero ser membro da Igreja porque não gosto que minha vida seja da alçada de ninguém. A autoridade espiritual do pastor ou da pastora sobre mim implicaria grande responsabilidade. Assim, não tenho de prestar contas de nada do que faço ou deixo de fazer.
Não quero ser membro da Igreja porque posso participar dos ministérios, da Santa Ceia, ser dizimista, estar nos cultos sem a necessidade de um ritual ou um pedaço de papel que me diga o que sou ou não. Se você pensar bem, esta é a mesma razão pela qual as pessoas querem “morar junto” hoje em dia, sem estar casadas legalmente. É ter as recompensas sem o peso dos deveres. O outro nunca pode exigir nada, porque, se eu não gostar mais, posso simplesmente ir embora sem ter de dar satisfações a ninguém.
Não quero ser membro da Igreja porque gosto de circular por aí, conhecer novas ideias e novas pessoas. Ser membro significa aderir a um conjunto de preceitos e eu não gosto que ninguém me diga o que pensar ou não. Existem coisas com as quais eu não concordo na Igreja, até mesmo doutrinárias. Sem ser membro, não tenho compromisso com nada disso.
Não quero ser membro da Igreja para não ter a responsabilidade pessoal de zelar pelo meu testemunho em relação a ela. Se alguém me perguntar alguma coisa, digo simplesmente que frequento, estou visitando, vendo “qual é”.
Não quero ser membro da Igreja para não ter de sustentar as coisas chatas que toda Igreja tem. Posso fazer o que quiser, sem ser requerido. Não tenho a obrigação de amar ninguém nem de sustentar ninguém com minhas orações. Se alguém pegar no meu pé, posso ameaçar ir para outra comunidade, quem sabe fazer alguma pressão por causa do dízimo que entrego. Ao fazê-lo, fico aparentemente mais fiel do que aquele que, sendo membro, não faz tudo o que eu faço.
Só que há alguns problemas... mas eu não gosto de pensar muito sobre isso.
Quando não assumo integralmente meu papel como membro da Igreja, vivo parcialmente o amor de Cristo. Não serei nunca capaz de “alegrar-me com os que se alegram e chorar com os que choram” (Rm 12.15), porque meu envolvimento é sempre parcial. Sem conhecer o amor verdadeiro, posso ter todos os demais dons, mas de nada eles me adiantarão (1Co 13).
Quando eu entrego fielmente o dízimo, compareço aos cultos e participo dos ministérios, não estou fazendo favor algum à Igreja, ao pastor ou pastora, nem sendo mais santo que os membros assumidos que não o fazem. O erro deles não justifica minha arrogância. De certo modo, eu fico parecendo o fariseu que subiu ao templo para orar (Luc 18.9-14). Estou apenas cumprindo meu dever cristão, mas se faço isso apenas para não ser cobrado, então “já recebi minha recompensa” (Mt 6.6).
Quando eu não me torno membro da Igreja, torno-me uma anomalia, uma parte do corpo de Cristo que quer viver de si mesma. Mas um membro não pode ser separado do corpo sob o risco de morte, assim também, fora do corpo de Cristo, morremos, uma vez que a comunhão plena alimenta a espiritualidade saudável (1Co 12-14).
Se Cristo amou a Igreja e chegou a ponto de morrer por ela, quando não assumo integralmente meus votos numa comunidade local, corro o risco de situar-me fora desta esfera de amor, de santidade e de incorruptibilidade, mesmo considerando os defeitos e infortúnios que ela, como comunidade humana, santa e pecadora (no dizer de Martim Lutero) pode conter (Ef 5.25-27). Ao contrário, importa-me sofrer por ela: “Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja” (Cl 1.24).
O fato de ser membro de uma Igreja é consequência do fato de que me entreguei a Cristo, vivo por ele. É uma manifestação visível da transformação invisível que Deus opera no meu interior. Devo me alegrar por isso, e não achar-me sob o peso de uma obrigação. Damo-nos primeiro a Deus e depois uns aos outros na comunidade de fé (2Co 8.5). Como poderei dar-me por inteiro a alguém se não quero assumir publicamente meu compromisso para com essa pessoa ou grupo, de todos os meios e formas pelas quais me for possível fazê-lo?
Somente o fato de ser membro de uma igreja me dará a autoridade do reconhecimento que vem dos irmãos e irmãs, legitimando meu ministério junto a eles e tornando mais amplo o espectro da minha ação. Por ter-me como seu igual, companheiro de jugo e de lutas, com maior profundidade poderão testemunhar de mim e sentir que estou 100% com eles, como aconteceu com Tito (2Co 8.16-23). Os membros da Igreja são neste texto chamados de “companheiros no desempenho da graça”, “companheiros e colaboradores”, “mensageiros da Igreja”, “glória de Cristo”. E Paulo lhes exorta a demonstrar “a prova do amor e da exultação” perante a Igreja quando membros desse porte estiverem diante dela.
Se há sobre a comunidade um pastor ou pastora fiel, com amor no coração, atenção e fidelidade para com os princípios bíblicos e doutrinários, minha insubmissão é sinal de rebeldia ao Senhor e ao seu corpo. Tenho de considerar profundamente as motivações que me levam a não querer uma autoridade espiritual sobre mim. É claro que há os que abusam, mas a Bíblia chama a estes de mercenários. Os pastores e pastoras verdadeiros são reconhecidos por sua autoridade vinda do Espírito, seu amor e zelo pela comunidade, sua seriedade no testemunho e na oração. A estes, a carta aos Hebreus recomenda obediência e submissão (Hb 13.17). Tenho de admitir se não quero que o pastor ou pastora me oriente espiritualmente porque ele ou ela não é uma pessoa de Deus (e isso não cabe a mim, individualmente, decidir) ou se é porque esta liderança espiritual me confronta diretamente em meu coração endurecido, em meus pecados de estimação ou na confrontação da entrega total a Cristo, que ainda resisto a fazer. Se for assim, é para pensar profundamente a minha vida, pois “se alguém não sabe governar a sua própria casa, terá cuidado da igreja de Deus?” (1Tm 3.5)! Esta reflexão e constatação cabem somente a mim e somente o Espírito pode revelar-me inteiramente isso. Mas se me nego a pensar, também me nego a ser transformado...
Cristo edifica a sua igreja e afirma que as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16.18). Como eu posso ser edificado se não quero afirmar categoricamente que faço parte da Igreja? Como poderei, assim, fazer com que o inferno não prevaleça contra mim? Preciso estar na igreja para saber “como convém andar na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade” (1Tm 3.15)

Como disse alguém, a Igreja não é para ser conveniente, nem condescendente, mas contundente. Se eu quiser ser mais um na multidão, posso estar na igreja sem assumi-la. O problema disso é que Cristo não vai me conhecer quando isso for necessário (Mt 25). Mas se quiser ser discípulo, não devo fazer o que eu quero – sou instado a deixar o meu eu e assumir o fardo do meu irmão (Gl 6.2). Ser membro da Igreja é um passo fundamental e um grande desafio. Paulo concorda: “Além das coisas exteriores, me oprime cada dia o cuidado de todas as igrejas” (2Co 11.28), porque não basta estar no rol, é preciso estar por inteiro, pela vida inteira, com a inteira vida.
Mas o resultado do compromisso pleno é, igualmente, grandioso:
“Para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus” (Ef 3.10).

2 comentários:

  1. Hideilde

    Há um prêmio para você no Blog Brasil Liberdade e Democracia. Infelizmente não vou te encontrar no Concílio por motivo de saúde. Bom concílio para vocês.

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  2. Olá, revda. Hideíde!
    Hoje quando voltava de uma visita, perguntava-me sobre sobre o papel da igreja. Vivemos um tempo, confesso, que somos cercados pela tentação do "sucesso". Sucesso tem representado se dar bem e satisfazer aos anseios do ego, muitas vezes.
    De fato, a humanidade está sedenta, como no tempo de Jesus. Mas a mensagem do evangelho continua a mesma anunciada pelo "Raboni": novidade; boa-nova.
    Que a igreja assuma seu papel profético e libertadora: ser o pensar, o falar e o agir de Cristo. A "presença" ainda não, do Reino entre nós.
    Fantástica reflexão!!!

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