Ontem... hoje... (uma imaginação
acerca das mulheres que foram ao túmulo de Jesus)
Ontem, eu vi Jesus Cristo
pendurado na cruz. Vi seus olhos cerrados, seu lado ferido, suas mãos e pés
transpassados. Vi a esperança morta nos olhos dos Seus discípulos, o desespero
nas lágrimas das mulheres, a indiferença no rosto dos poderosos. Por um
momento, parece até que vi o próprio inferno em festa na multidão que gritara:
Crucifica-O! Crucifica-O!
Ontem, quando olhei para o alto,
eu vi o luto do céu. Às três horas da tarde, tudo escureceu porque os anjos não
podiam contemplar a tamanha maldade humana. Deus fechou Seus olhos por um
momento diante do último suspiro de Seu filho amado. As nuvens se escureceram
como se uma grande tempestade fosse desabar em lágrimas da natureza sobre o
próprio autor da vida, tomado pela morte. O sol se recusou a dar a sua luz,
para que seus raios não se refletissem no suor da testa de Jesus, nem nas gotas
de sangue e água que escorriam de seu lado ferido. O vento se recusou a soprar
para que o cheiro do sangue derramado ficasse suspenso no ar, nos lembrando de
que o salário do pecado é a morte – o salário do nosso pecado, pago por Jesus,
o mais perfeito sacrifício que se podia esperar.
Ontem, quando fui ao templo, eu
vi o anseio de Deus em romper toda separação. De alto a baixo, o véu do templo
se rasgou, pois agora não faz sentido nenhum segredo, nenhum lugar secreto,
porque Ele Se fez gente para que todos pudessem ver Seu rosto, olhá-Lo nos
olhos e tomar uma decisão definitiva. O Santíssimo Lugar agora, mais do que
nunca, deveria ser o coração de cada pessoa. Não havia mais necessidade de
peregrinar até Jerusalém, se os pés sagrados de Deus já haviam andado por toda
parte da Judéia e até da Samaria, unindo os povos brigados nos laços de amor do
mesmo Deus que estava no templo e no poço, em Sião e em Gerizim. Ontem , eu
vi o silêncio dos seguidores perdidos... vi a decepção da gente do meu povo tão
sofrido, esperando redenção.
Um túmulo novo para um morto sem
nobreza. Linho puro para cobrir um corpo sujo, ferido, sangrado. Nem tempo para
funerais, para cumprir os costumes, para cuidar e embalsamar. Funeral feito às
pressas, que nem funeral de bandido, de marginal, de malfeitor...
Mas tudo foi ontem. Hoje, uma brisa nova passa por
cima da terra. O cheiro do sangue se foi. Os espinhos parecem esquecidos,
porque vejo brotos e flores por toda parte. Enquanto me aproximo do túmulo,
penso nisso. Trago perfume nas mãos e tristeza na alma. E no espanto que sinto,
vejo a pedra fora do lugar. Receosa, caio de joelhos, na expectativa, no medo,
na esperança, no desapontamento... Será? É a pergunta que me vem à mente...
Será que é possível? Olho em meus braços e tudo o que tenho nas mãos de repente
se torna inútil... Para que levar perfumes e bálsamos, se não existe mais morte
a lamentar? Isso tudo foi ontem e o ontem, graças a Deus, já passou.
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