Uma amiga, estudante de pedagogia, me perguntou como trabalhar as lendas com pais e mães evangélicos, que estão fazendo seus filhos e filhas faltarem às aulas sobre o tema.
Pergunto eu o que anda acontecendo com o mundo. Pergunto eu como é que a gente pode crescer como ser humano escutando e vivendo só o universo da gente. Refreando todo o conhecimento do outro e da outra.
Pensando do ponto de vista do que nós, cristãos e cristãs, queremos proclamar, como é que pode, ao menos, haver proclamação do Evangelho, que é acolhida, quando a gente para de escutar o outro, a outra?
O apóstolo Paulo me deu a deixa. Há coisas que são mandamentos do Senhor. Há coisas que são o bom senso, a experiência e o modo da gente de olhar a vida. Assim sendo, quero refletir sobre isso, dizendo eu, não o Senhor. Não pretendo ser a sábia, e também peço a gentileza de não esculhambar nos comentários porque isso aqui é uma opinião e talvez não queira dizer nada para você.
Bem, existem outras histórias e outras crenças além das nossas. Aprender sobre elas não significa abrir mão das nossas. Só quem não sabe em que crê tem medo da crença do outro ser humano.
Também revela nosso preconceito, porque, pasmem, muita gente que samba em cima do Pererê e da mula sem cabeça não tem problemas em ir ao cinema assistir Thor e Mulher Maravilha. Não percebem que são lendas também?
Glamourizadas e urbanizadas, mas originando-se de povos tão nativos quando indígenas e quilombolas... Ou não enxergam as lendas em Moana, Mulan e outros desenhos hollywoodianos? Vai-se proibir tudo que discorde de nossos pontos de vista? Criaremos universos paralelos ou particulares? Criaremos adultos mimados que não sabem compartilhar o espaço comum do trabalho, das vias públicas, dos países e fronteiras?
As histórias sempre foram um jeito de explicar o mundo. Lendas estão em toda a parte... ainda no século dezoito, só pra falar de casa, d. Suzanna Wesley discutia com os filhos sobre o fantasma que morava no andar de cima da casa. E o sujeito tinha até nome! Os ingleses acreditavam mesmo em assombração, sem maiores dramas... mas é que tem outro nome, né?
Lendas e superstições cristãs, como colocar copo dágua em cima do rádio, passar no corredor de fogo, levar carteira de trabalho pra ser benzida (ops! ungida) tá liberado?
Nada disso é crítica, ok? Só estou mostrando que o ser humano que Deus fez, com toda a sua imaginação fervilhante, precisa de histórias, ritos e marcos para processar sua forma de estar no mundo. Depois que passamos por isso, evoluímos um pouco mais e se necessário abandonamos isso em função do novo aprendizado.
Parábolas de Jesus não são fruto do acaso, são a percepção do Pai Celeste de que a gente entende melhor quando tem um "causo".
Estamos roubando a oportunidade de nossas crianças serem mais compreensivas sobre o mundo, viverem com mais amor e acolhida, terem uma mente mais imaginativa e superarem seus medos infantis. Porque também é pra isso que a lenda serve.
E depois que eles e elas passarem dessa fase, as histórias só serão boas lembranças. Mas se a gente não deixar nossos filhos e filhas experimentarem o mundo, dando-lhes os parâmetros de valores que achamos ser necessários, como eles e elas poderão fazer boas escolhas no futuro?
Não confiamos que a educação que damos a eles e elas em casa é o bastante para que tenham discernimento? Então a falha é nossa!
Tiro por mim que os melhores aprendizados talvez estejam sendo agora, que minhas filhas estudam em uma boa escola, mas que possui muitas nuanças diferentes daquelas em que cremos. Nunca conversamos e debatemos tanto sobre a vida, a fé, os ensinos! Tem sido desafiador. E crescemos.
Não tenha medo da Semana do Folclore na escola. Deixe seus filhos e filhas saberem que o mundo é muito mais do que eles e elas vivem hoje. Outras coisas "piores" (por favor, note as aspas!!) do que essas lhe parecem hoje virão pela frente. Estão no currículo da vida, ao qual ninguém pode escapar.
É melhor que possamos prepará-los, parando de transferir para a escola a nossa tarefa. Lá se operam conteúdos, saberes e dados. Aqui em casa é que a gente faz que nem pescador na praia. Senta com calma e verifica o que serve, como serve, para que serve e o que vamos fazer com isso.
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